Oras, por que não posso me jogar de cabeça na felicidade?

calvinCow1

Adrián Castro era herdeiro de um famoso vinhedo em Rioja.
Felipa era uma linda moça de origem muito mais modesta.
Adrián conheceu Felipa e se apaixonou.
Mesmo com o grande desnível social, ele decidiu pedi-la em casamento.
Felipa recusou.
Ela se sentia desqualificada pelo contrato de separação total de bens.

Adrián ficou desolado.
Tentou convencê-la de todas as formas.
Felipa então declarou que se ele realmente a amava, saberia que aquele contrato ofendia a honradez dela.
E que seu amor era sincero e desinteressado.
E que ela o amaria até o fim da vida.
Portanto o tal contrato não fazia sentido.
Adrián cedeu, convencido de que ela estava certa.

Seu melhor amigo tentou dissuadi-lo.
Em vão.
Adrián estava disposto a provar seu amor por Felipa da forma como ela entendia.
Os advogados da família vieram alertá-lo.
Comunhão total de bens como Felipa queria, daria a ela acesso irrestrito à herança dos Castro.
Mas Adrián ignorou os conselhos legais e casou-se com Felipa nos únicos termos que ela aceitava.
E assim iniciaram uma família feliz.

Foram morar em Rioja.
Quando o segundo filho do casal completou 10 anos, Adrián mudou-se com a família para uma mansão em Madrid.
Assim que se instalaram, o pai de Adrián faleceu.
Adrián teve então que ir ao Chile assumir os vinhedos recém adquiridos por Don Castro.
Deixou a família na mansão.
Voltou um mês depois.

Ao desembarcar em Madrid, foi surpreendido no aeroporto por seus advogados.
Felipa iniciara um processo de divórcio e uma ordem judicial o impedia de entrar em sua mansão.
Na verdade já havia outro homem morando com ela e Adrián não tinha mais quaisquer chances de reconciliação.
Os advogados agora tentavam encontrar uma forma de anular os direitos que Felipa tinha sobre a herança do sogro.
Mas não tinham muitas esperanças pois Don Castro havia morrido antes do pedido de divórcio.

Parece assustador?
Essa é uma história rigorosamente baseada em fatos reais.
Provavelmente é muito mais complexa do que o que narrei aqui.
Porém não precisamos de mais informações para entender os equívocos do protagonista.
Equívocos estes fáceis de se enxergar depois do fato consumado.
A questão entretanto se resume não a enxergar depois e sim antes que a vaca vá para o brejo.

Então vamos lá.
O que sabemos de concreto desta história?
A rigor só sabemos de uma coisa: que tanto Adrián quanto Felipa, queriam ser felizes.
E que estavam dispostos a pagar preços bem diferentes por essa felicidade.
Adrián estava decidido a comprometer metade de seus bens e de sua futura herança para ter Felipa – e ser feliz.
Felipa por sua vez, estava disposta a abandonar Adrián – e sua felicidade – se fosse impedida de ter acesso ao patrimônio dele.
Desigual, não acha?

Adrián foi enganado?
Sim, foi.
Mas não por Felipa e sim por si próprio.
Ele convenceu-se de que não havia risco nenhum em apostar cegamente na proposta de Felipa.
Proposta essa que tinha como alicerce único, uma vida perfeitamente feliz pelos próximos 60 ou 70 anos de vida conjugal.
Ao acreditar nisso, Adrián fechou os olhos para algumas questões a se considerar:
1. Nada garante uma vida inteira de felicidade.
(Se você conhece algo ou alguém que garanta, por favor, faça-me saber e salve-me do meu ceticismo absurdo.)
2. Apesar de parecer clichê, não existe felicidade condicionada a uma determinada pessoa.
Nem a várias.
A experiência cansa de mostrar isso.
3. Um relacionamento que começa com condições e imposições tem escassa (ou nenhuma) chance de sucesso.
4. A exigência de comunhão total de bens feita por Felipa não combinava com o amor verdadeiro e eterno declarado por ela.

Felipa mentiu para Adrián?
Talvez.
Ela pode ter acreditado no que falava.
Depois a realidade se mostrou diferente do sonho e ela resolveu mudar de príncipe.
Por outro lado, pode ter percebido que tinha controle sobre Adrián e resolveu impor seus interesses.
Não importa.
Porque Adrián era o único responsável por zelar por sua própria felicidade.
E não, submetê-la aos interesses de sua amada.

Então Adrián não tinha saída a não ser desistir de Felipa?
Não necessariamente.
Há ainda um aspecto que abre uma alternativa
Adrián era muito mais rico que Felipa.
Para viver com ela, ele certamente investiria parte de seu patrimônio para trazê-la para mais perto de seu status.
A solução para as diferenças do casal estaria em como fazer isso.
O mais equilibrado seria Adrián debater com Felipa as preocupações e medos de ambos.
E encontrar uma solução intermediária que atendesse aos dois e não simplesmente ceder metade de seu patrimônio à esposa.

Adrián falhou ao não enfrentar essa questão.
Ele optou pela saída mais cômoda, apostando em um conto de fadas.
Pior: foi alertado para os riscos que corria e não deu atenção.
Provavelmente ficou com medo de perder Felipa se colocasse suas necessidades em pé de igualdade com as dela.
Perdeu-a da mesma forma e ainda pagou um preço alto, sem nem ao menos ter se preparado para isso.

Para concluir, dá para se jogar de cabeça na felicidade?
Claro!
Basta você não colocar em risco o que quer que realmente lhe fará falta.
Mas se você ainda está convencido(a) de que mergulhar na sua felicidade significa bancar o(a) irresponsável, então você tem duas alternativas.
Preparar-se para minimizar o estrago caso a vaca se encaminhe para o brejo ou….
Ter a consciência de que se tudo der errado, você só poderá assistir o bovino afundar na lama, sem reclamar de sua sorte.

“Você não consegue escapar da responsabilidade de amanhã esquivando-se dela hoje.” – Abraham Lincoln

Obrigada por seu interesse.
Seus comentários, sugestões e criticas serão muito bem-vindos.
😉