Você acredita que é melhor ficar quieto do que falar uma bobagem?
Lá está Yuri, engenheiro júnior, em uma visita técnica à usina de Angra II.
Junto com ele estão seu gerente de projeto e um físico nuclear.
O gerente tem, entre outras credenciais, 10 anos de experiência na Alemanha em plantas de geração de energia atômica.
O físico tem PhD no MIT e já chefiou um projeto semelhante na Índia.
Yuri nunca trabalhou na área nuclear.
Em um dado momento, o gerente e o físico começam um debate técnico sobre aquela instalação.
E como consequência, acabam presenteando o jovem engenheiro com uma enxurrada de experiências práticas.
Yuri fica muito interessado mas não consegue acompanhar nem a metade do que é dito ali.
Sente-se tentado a fazer perguntas.
Mas não tem coragem.
Elas seriam muito primárias e poderiam soar ridículas.
Então fica quieto e limita-se a aprender o que alcança.
Ou:
Anton é um executivo bastante experiente que precisa informar-se sobre uma nova tendência de mercado.
Começa a ler tudo o que encontra a respeito, inscreve-se em um curso sobre a matéria e contrata um expert como consultor.
Anton se atualiza mas falta-lhe a prática.
Então passa a frequentar fóruns e palestras sobre o tema.
Nesses eventos sua atenção se volta especialmente para a parte de perguntas aos palestrantes.
E na plateia, o executivo formula mentalmente várias questões.
As elabora, refina, aperfeiçoa mas… não chega a apresentar nenhuma.
Fica inseguro a respeito da relevância de suas dúvidas e não quer correr o risco de parecer desinformado.
Ou de fazer perguntas sem pé e nem cabeça.
Ou de passar qualquer outro constrangimento previsível.
O que você faria no lugar de Anton e Yuri?
De minha parte, já passei por situações semelhantes.
E fiquei quieta em lugar de me manifestar.
Também conheço um número razoável de pessoas que, em cenários equivalentes, mantiveram-se calados.
Mas será que eu e todas essas pessoas teríamos dito bobagens se tivéssemos aberto a boca e falado o que queríamos?
Não sei.
Provavelmente em algumas ocasiões sim e em outras não.
Surge então a questão: em que situação, correr o risco de falar bobagem vale mais a pena do que ficar quieto?
Não dá para pensar em todos os contextos possíveis que atendam a essa pergunta.
Entretanto existe uma situação especial que vale a pena avaliar.
É aquela onde seu objetivo é aprender ou ser informado de alguma coisa nova.
Por exemplo, em uma palestra, uma aula, a apresentação de um produto ou de uma novidade qualquer.
Ou ainda em contextos não tão óbvios assim.
Como a reunião do Conselho de Administração onde alguém apresenta informações que você não necessariamente conhece.
Ou o bate-papo casual de dois especialistas onde o assunto lhe interessa mas você não faz parte da conversa porque não chega aos pés deles em conhecimento.
Não importa o quão inadequada possa parecer a ocasião.
O que importa é a sua condição de quem está ali para aprender.
Essa é uma posição privilegiada que na maioria das vezes, não é desfrutada.
Ao contrário, muitas vezes estamos pagando para que nos ensinem e não aproveitamos a fonte de informação como poderíamos.
Isso acontece porque, para fazermos perguntas, temos que revelar o nosso desconhecimento.
Temos que expor nossa ignorância e correr o risco de sermos julgados por ela.
E no fundo temos medo de que o julgamento seja negativo.
De fato, não podemos descartar essa hipótese.
Não temos como saber que motivos levam alguém a nos criticar.
A única coisa que podemos ter certeza é de que tais motivos são questões que pertencem a quem critica.
Não a nós.
A nós cabe cuidar de nossas próprias questões.
E (respeitosamente…) os outros que cuidem dos respectivos incômodos.
Então, quando a dúvida é “pergunto ou não pergunto”, um bom começo é certificarmo-nos de que é adequado fazer isso.
Oras, nos contextos definidos, não é muito difícil perceber o quão legítimo é fazer perguntas.
Não faz nenhum sentido pretendermos passar por bem informados justamente quando queremos aprender.
Também não faz sentido que, quem detém o conhecimento, espere que sua audiência saiba tanto quanto ele.
Ainda mais se sua função naquele momento é informar.
Portanto se pedir informações é legítimo, podemos pensar em como fazer isso.
A princípio, qualquer pergunta feita com a finalidade de aprender é válida, desde que não seja hostil de alguma forma.
Mas podemos ir além de só sermos gentis e educados.
Podemos cuidar para formular essas perguntas de uma forma que nos deixe confortáveis em vez de intimidados.
A ideia central é fazer isso com simplicidade.
Ou seja, perguntar sem nenhuma pretensão de mostrar o conhecimento que não temos ou, de esconder a nossa ignorância.
Simplesmente perguntar, no real intuito de aprender.
Atitudes assim sinceras e despretensiosas são normalmente muito bem recebidas.
E dificilmente provocam julgamentos negativos de quem quer que seja.
Há ainda alguns pequenos truques que podem desarmar o interlocutor mais crítico.
Eles consistem basicamente em despertar a face colaborativa das pessoas.
Como por exemplo, provocar a empatia de quem recebe suas perguntas, apresentando previamente sua ignorância, seu despreparo ou sua dificuldade em entender.
Ou, invocar a vaidade do interlocutor, destacando o quão importante é para você, ter sua atenção e partilhar de seu conhecimento.
Qualquer que seja a estratégia, se desarmar os espíritos e despertar a boa vontade, vale a pena.
Há ainda um ganho adicional ao fazermos perguntas quando ninguém mais faz.
É provável que não sejamos os únicos tentando vencer o medo da exposição.
E ao rompermos essa resistência, encorajamos os demais a fazerem o mesmo.
O resultado geralmente é um debate muito mais fértil e positivo, onde todos saem ganhando
E de quebra reforçamos nossa segurança para, no futuro, correr esse risco com muito mais tranquilidade.
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Agradeço a paciência e interesse de quem lê meus posts.
Como sempre, comentários e críticas são muito bem-vindos.
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