Você tem certeza de que pode ensinar ética para seus filhos?

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Por mais surpreendente que pareça, o que a maior parte das pessoas sabe sobre ética está na verdade muito mais ligado à moral.
Até seis meses atrás, parte do que eu pensava que fosse ética não era.
Precisei de um debate com alguns amigos para perceber que tinha dúvidas e só então resgatar a concepção correta dessa filosofia.

Na verdade, prevalece entre a maioria de nós uma grande confusão entre os conceitos de ética e moral.

Talvez seja melhor refrescá-los:
Ética é a parte da filosofia que estuda a conduta humana a partir dos princípios universais do bem e do mal e é permanente.
Moral é um conjunto de regras que estabelece o certo e o errado válidos para uma determinada sociedade e é temporal.

Confuso?
Aprofundemos um pouco mais…

As leis que regem uma sociedade são a tradução do código moral daquela população.
Elas deveriam ser elaboradas inteiramente sob o respaldo da ética mas isso nem sempre acontece.
A lei que permitia ter escravos no Brasil até 1822, por exemplo, era fruto da moral da época mas não era ética.
Tivemos que esperar que o entendimento ético da população brasileira evoluísse para só então abolir essa lei descabida.

Por outro lado, há regras morais que aparentemente são éticas mas que na verdade carecem de reflexão sobre suas consequências para serem cumpridas com segurança.
Não mentir por exemplo, é uma regra moral bastante comum e aparentemente ética.
Entretanto nem sempre sua aplicação gera resultados éticos.

Que tal contextualizarmos?

Um homem fugia de bandidos violentos quando encontrou, sentado à beira do caminho, o profeta Maomé.
Dirigindo-se ao profeta, o homem pediu socorro.
Maomé respondeu: continue a fugir bem à minha frente e eu me encarregarei dos que o perseguem.
Assim que o homem se afastou, o profeta levantou-se e sentou na direção de outro ponto cardeal.
Os bandidos chegaram e sabendo que Maomé só poderia dizer a verdade, descreveram o homem e perguntaram-lhe se ele o havia visto passar.
Maomé pensou por um momento e respondeu:  desde que estou sentado aqui, não vi passar ninguém.
Conformados, os bandidos foram embora e o fugitivo se salvou.

Maomé foi ético ou moralista?
Sob os padrões de conduta moral daquele tempo, ele foi imoral.
Teria que dizer rigorosamente a verdade e não foi o que fez.
Em termos absolutos Maomé enganou os malfeitores.
Ele  não respondeu à pergunta que eles fizeram.
Os bandidos queriam saber se o profeta tinha visto uma determinada pessoa e não se ele tinha visto alguém “desde que estava sentado ali”.
Sob o olhar da ética filosófica entretanto, Maomé teve um comportamento ético.
Encontrou uma alternativa inteligente para dizer a verdade e simultaneamente salvar a vida do fugitivo.

Nessa história, o fato de o rigoroso respeito à moral contrariar a ética, mostra que a primeira não pode ser entendida como se fosse a segunda.
Mostra também que nem sempre dá para atender aos dois conceitos simultaneamente.
Há situações em que a melhor escolha é ser ético ao preço de ser simultaneamente imoral.

Um exemplo famoso é o da costureira negra Rosa Parks que, em 1955 no Alabama, transgrediu a lei de segregação racial em transporte público.
Rosa havia sentado em um lugar indicado para negros mas o ônibus lotou e algumas pessoas brancas que entraram depois dela ficaram em pé.
O motorista exigiu que Rosa levantasse de onde estava para ceder seu lugar a um branco.
Ela se recusou.
O motorista chamou a polícia, que a prendeu e a multou em dez dólares.

Do ponto de vista do código moral vigente – ou seja, a legislação – , Rosa estava errada.
A Lei da Segregação Racial do Alabama amparava a atitude do motorista de exigir que ela cedesse seu lugar a um branco.
A questão é que a regra moral era antiética.
Rosa então teve respaldo nos princípios éticos para seu ato de desobediência civil.
Sua atitude foi tão importante que ela se tornou o maior ícone internacional da resistência à segregação racial.

Este fato histórico mostra claramente que não podemos confundir moral com ética.
Por conseguinte, não basta seguir cegamente as regras morais vigentes.
Temos que fazer uma reflexão sobre elas e analisar suas consequências do ponto de vista do bem e do mal produzidos.
Essa análise só é possível se entendermos com profundidade o que é ética.
É muito importante então, que voltemos a estudá-la.
É importante debatê-la, refletir sobre ela e exercê-la.

Por outro lado, precisamos ter consciência de que em algum momento da vida é provável que todos nós sejamos  antiéticos.
Ao passarmos o farol fechado ou ao não oferecermos nosso lugar a uma pessoa mais velha.
Ao cedermos ao preconceito e também ao tolerarmos comportamentos antiéticos alheios sem reagir.
Isso não significa que não possamos melhorar ou que não tenhamos o direito de  cobrar a evolução ética da nossa sociedade.
Podemos saber que não somos 100% éticos e que talvez nunca seremos.

Ainda assim, se queremos evoluir, devemos perseguir a ética como um norte em nossas vidas.
E exercê-la para nosso crescimento e satisfação pessoal e não para escaparmos de punição, sermos admirados ou premiados.

Não é uma missão fácil mas os frutos de sermos éticos são o melhor legado que podemos deixar para as futuras gerações.

“O homem que quiser inovar para o bem, inexoravelmente, passará por cinco estágios: indiferença, ridicularização, ofensa, repressão e, finalmente, respeito”.  – Mahatma Gandhi.

Obrigada por seu interesse e paciência.
Seus comentários, críticas e sugestões serão sempre bem-vindos.