Será que Eva decidiu morder a maçã porque buscava a felicidade?

CalvinFeliz2

“Felicidade é uma cenoura balançando à nossa frente (…), sempre ligeiramente fora do nosso alcance.” – Daniel Nettlem

Essa foi a melhor definição que encontrei para essa emoção.
Entretanto se a frase fosse minha, eu substituiria a cenoura por uma caixinha de surpresas.
Não temos certeza do que tem dentro dela mas imaginamos que seja um monte de coisas maravilhosas.
Então, desejamos e perseguimos essa caixinha com ardor.

Às vezes, com muito esforço, conseguimos alcançá-la.
Pegamos algo de dentro e nos sentimos realizados e felizes.
Mas logo ela volta a balançar tentadoramente à nossa frente e lá vamos nós persegui-la novamente.

A grande pergunta é: por que não permanecemos eternamente felizes com a primeira coisa que tiramos da caixinha?

“As leis que governam a felicidade não foram desenhadas para nosso bem-estar psicológico, mas para aumentar as chances de sobrevivência dos nossos genes a longo prazo.” – Robert Wright

Portanto a felicidade é um artifício que a natureza criou para garantir a perpetuação de nossa espécie e não para que sejamos eternamente felizes.
A coisa funciona assim: quando fazemos algo que aumenta nossas chances de sobreviver ou de procriar, nos sentimos muito bem.
Por um tempo…
Então essa sensação passa e sentimos falta dela.
Ao sentir falta, repetimos a experiência que a provocou.
É essa repetição do que nos provoca bem estar, que aumenta nossas chances de transmitirmos nossos genes.

Claro que as coisas evoluíram bastante.
Nos primórdios da humanidade, ser feliz resumia-se a reproduzir, caçar para ter alimento e achar uma boa caverna para viver.
Nos nossos dias, a busca pela felicidade nos move a outros objetivos.
Estudar, trabalhar, realizar coisas, ganhar dinheiro, gastar dinheiro, fazer amigos, brigar, casar, separar, ter filhos etc.

Mas se você prestar atenção, tudo não passa de um truque da natureza.
Cada vez que conquistamos o que pensamos que nos trará felicidade, uma nova necessidade surge.
E lá vamos nós começar a persegui-la novamente.
Não lhe parece tremendamente injusto?

Entretanto, não é.

“A felicidade foi projetada para evaporar”, escreveu Robert Wright.

Segundo ele, a razão desse efeito efêmero é evolutiva: “se a alegria que vem após o sexo não acabasse nunca, então os animais copulariam apenas uma vez na vida”, ele disse.

Já imaginou que desastre seria?
No mínimo, ninguém mais se interessaria por namorar, nem beijar e nem fazer amor.
E ainda que, por um milagre, essa queda vertiginosa na frequência de acasalamento não nos extinguisse, sofreríamos outras consequências terríveis.
Acontece que felicidade, por definição, é um estado no qual não temos vontade de mudar nada.
Isso significa que se fôssemos o tempo todo felizes sem qualquer esforço, nossas vidas estacionariam.

Não iríamos mexer uma palha do lugar.
Não nos motivaríamos mais a descobrir coisas novas.
Nem a criar, melhorar, desenvolver.
Nossa evolução deixaria de acontecer.
Talvez ainda estivéssemos no estágio de Lucy, a mais famosa ancestral humana.

É a busca da felicidade  que nos empurra para a frente.

Que nos faz evoluir, superar obstáculos, inventar coisas novas, querer sempre ir além.
Por isso, um pouco de ansiedade, de insatisfação, não é só necessário como também, saudável.

A grande questão que se apresenta nos dias de hoje é que grande parte da humanidade quer viver a vida sentindo apenas felicidade.
Sem ficar triste, sem sofrer, sem passar por perdas, privações e contrariedades.
Por causa disso, essas pessoas estão dispostas a qualquer coisa para serem eternamente felizes – ou se iludirem que o são.
Desde viverem à base de antidepressivos até comprometerem seu futuro por causa da felicidade no presente.

Isso lhe parece algo bem distante de você?
Então vamos conferir.

Quantas vezes você decidiu em favor de seu bem estar presente e fingiu que não viu as consequências futuras dessa decisão?
Não lembra?
Vamos ver se ativo sua memória.
Quantas vezes você gastou mais do que podia?
Quantas vezes comeu ou bebeu mais do que devia?
Quantas horas você passou se bronzeando sob o sol para ficar mais bonito(a) sem considerar as consequências futuras para sua pele?
E quantas vezes você manteve próximas as pessoas erradas para ter a ilusão de sentir-se amado(a)?
(Neste último caso, não é nem o futuro que você compromete e sim o presente.)

Quando as consequências de suas decisões irresponsáveis têm solução, ótimo, você ganha uma segunda chance.
E quando não têm?
Ou quando, apesar de ter, você não aprende nada e continua repetindo as decisões irresponsáveis?

Parece que a felicidade pode nos tirar a noção de que haverá consequências.
Ela pode simplesmente nos cegar para o futuro, desde que estejamos felizes no presente.
Então muitas vezes você sabe que está fazendo algo errado.
Mas parece tão bom continuar assim que você fecha os olhos para as consequências.

A fábula italiana de Pinnocchio, no trecho da Ilha dos Prazeres, mostra bem esse mecanismo.
Apesar da história de Pinocchio tratar basicamente da mentira, o que se vê ali é a entrega dele aos prazeres para ser feliz.
Sem medir as consequências.
Ou sem escutar o Grilo Falante, que nada mais é que sua razão e bom senso.

Então querer ser feliz é sempre uma armadilha?
Claro que não.
O problema não é a felicidade e sim, as decisões inconsequentes que você toma para conquistá-la.

E é sobre isso que vamos falar no nosso próximo post.

Se você quiser acrescentar algo, por favor fique à vontade.
Seus comentários e sugestões são sempre bem-vindos.